Alguns grupos tradicionais da Amazônia acreditam que certas doenças nada mais são do que distúrbios causados por atitudes que desagradam entidades do plano Espiritual. Estas crenças recebem nomes como xamanismo e pajelança, que não devem ser confundidas com outras atividades que também fazem o uso de plantas medicinais (fitoterápicos) como a puçangaria. A diferença é que estes não têm o cunho religioso e sim medicinal, sendo que o mesmo é baseado no conhecimento empírico. E é sobre este que vou contar lhes uma história de um mestre no assunto.
Raimundo dos Santos Souza nasceu em 21 de agosto de 1926 aqui em Macapá - na época a cidade ainda fazia parte do Estado do Pará. Já na sua infância ele teve os primeiros contatos com pesquisadores estrangeiros que passavam temporadas aqui. Sempre fazendo o trabalho auxiliar. Também andava no mato para tirar madeira com seu pai e foi neste período que teve os primeiros contatos com as plantas. Menino inteligente e curioso, por isso recebeu o apelido de "Sacaca", que quer dizer "um grande conhecedor da floresta".
Com o tempo seu conhecimento sobre as plantas foi aumentando. Dotado de uma memória invejável foi construindo sua fama de forma empírica. Nunca freqüentou uma academia ou curso superior de biologia, mas deixou três obras que falam, de A a Z a respeito das plantas que curam. Negro, morador do Bairro do Laguinho, um dos mais tradicionais de Macapá pelas suas raízes afro. Logo ficou famoso em toda a cidade pelos bons resultados alcançados através de suas ervas e garrafadas (mistura de várias plantas). A população o procurava para a cura de diversas doenças. Uma antiga moradora, Dona Duce Carmen, nos dá um bom exemplo disso em seu relato.
"Eu tinha uma dor nos rins que tinha anos e anos. Procurei três doutor e os remédios que eles passavam não deram resultado. Foi aí que a dona de uma baiúca do canto de casa disse pra mim ir lá com o Sacaca. Cheguei lá, ele tava sentado num banco na frente da casa dele sem camisa e brincando com uns meninos. Eu primeiro fiquei meio assim, três doutor não deram jeito, como aquele sinhô ia dar? Mas eu falei com ele e ele me recomendou o chá de Quebra-pedra. Fui meio desanimada pra casa, mas comecei a tomar o chá. Um mês depois eu já tava boa. (...). Depois disso tudo o que eu tinha eu ia lá com ele e recomendava pros outros também."
Depoimentos como este podem ser encontrados aos montes na cidade. O falecimento de Sacaca em 1999 foi motivo de luto para toda a população. Todos os moradores o conheciam ou já ouviram falar dele. Seu nome se encontra registrado no "Museu Sacaca" e este acúmulo de experiências não se perdeu. A lista de plantas que curam é enorme e foi usada não só por ele, mas por uma grande quantidade de mulheres de origem cabocla e indígena. Veja algumas:
Alfavaca – Banhos e combate o resfriado.
Alho – Pressão alta, resfriado, gazes.
Amor crescido – Tratamento de fígado e queda de cabelo.
Anador – Qualquer tipo de dor.
Andiroba – Massagens em lesões, combate inflamações e males na garganta.
Arruda – Dor de cabeça e mal olhado.
Babatemão – Estômago e inflamação uterina.
Boldo – Derrame, fígado e estomago.
Cana-ficha – Rins e infecção urinária.
Capim marinho – Calmante e pressão alta.
Catuaba – Reumatismo.
Cheiro da mulata – Derrame e infarto no miocárdio.
Comida-de-jaboti – Pressão alta.
Erva doce – Fígado.
Erva sidreira – Pressão alta e calmante.
Hortelã – Gripe, dor de cabeça e mal estar.
Hortelãzinho – Cólica infantil.
Manjericão – Banhos e combate o resfriado.
Parirí – Anemia.
Pata-de-vaca – Diabetes.
Pião branco – Combate a asma e sicatriza.
Pirarucu – Desinflamatório e vesícula.
Pracaxí – Desinflamatório.
Quebra-pedra – Pedra nos rins.
Sacaca – Anticoncepcional, é diurético e combate a diabetes.
Sucuúba – Inflamação uterina e gastrite.
Trevo roxo – Dor de ouvido.
Existem casos em que a mesma planta é usada para combater doenças de forma variada e algumas tem mais uso medicinal do que consta na lista. Hoje, diversos governos e ONG’s começam a apoiar este levantamento e incentivar a construção de postos de atendimento a população e agentes de saúde qualificados na etnobotânica e etnomedicina. No Amapá, o projeto Farmácia da Terra do IEPA (Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá) nos dá um bom exemplo de interatividade entre o saber popular e o conhecimento científico. São feito trabalhos de levantamento destes dados nas comunidades tradicionais para que os fins em que cada planta é usada sejam comprovados cientificamente. Tudo feito no Centro de Plantas Medicinais do Instituto. Por exemplo, a planta Pata-de-vaca é usada no combate a diabetes por muitas comunidades. O que o IEPA faz é verificar se tal planta contém princípios ativos que realmente combatem a doença. Esse método vem dando certo e hoje são mais de 70 produtos.
O resultado é uma série de fototerápicos em forma de xaropes, pílulas, ungüentos e chás que combatem uma grande diversidade de doenças. Estes remédios são vendidos na farmácia do IEPA a preços simbólicos. Algo em torno de R$ 2,00. Existem também diversos fito cosméticos como o Shampoo de Babosa e o Sabonete de Andiroba. Tudo feito à base de insumos naturais e com pouquíssimas contra-indicações.
Esta é uma prova da eficácia do conhecimento das culturas tradicionais. Figuras como o Sacaca devem ser reconhecidas não apenas como agentes propulsores deste conhecimento, mas também como legítimos e importante colaboradores da saúde, pois os mesmos são uma ótima alternativa aos remédio alopáticos e suas contra-indicações.
Raimundo dos Santos Souza nasceu em 21 de agosto de 1926 aqui em Macapá - na época a cidade ainda fazia parte do Estado do Pará. Já na sua infância ele teve os primeiros contatos com pesquisadores estrangeiros que passavam temporadas aqui. Sempre fazendo o trabalho auxiliar. Também andava no mato para tirar madeira com seu pai e foi neste período que teve os primeiros contatos com as plantas. Menino inteligente e curioso, por isso recebeu o apelido de "Sacaca", que quer dizer "um grande conhecedor da floresta".
Com o tempo seu conhecimento sobre as plantas foi aumentando. Dotado de uma memória invejável foi construindo sua fama de forma empírica. Nunca freqüentou uma academia ou curso superior de biologia, mas deixou três obras que falam, de A a Z a respeito das plantas que curam. Negro, morador do Bairro do Laguinho, um dos mais tradicionais de Macapá pelas suas raízes afro. Logo ficou famoso em toda a cidade pelos bons resultados alcançados através de suas ervas e garrafadas (mistura de várias plantas). A população o procurava para a cura de diversas doenças. Uma antiga moradora, Dona Duce Carmen, nos dá um bom exemplo disso em seu relato.
"Eu tinha uma dor nos rins que tinha anos e anos. Procurei três doutor e os remédios que eles passavam não deram resultado. Foi aí que a dona de uma baiúca do canto de casa disse pra mim ir lá com o Sacaca. Cheguei lá, ele tava sentado num banco na frente da casa dele sem camisa e brincando com uns meninos. Eu primeiro fiquei meio assim, três doutor não deram jeito, como aquele sinhô ia dar? Mas eu falei com ele e ele me recomendou o chá de Quebra-pedra. Fui meio desanimada pra casa, mas comecei a tomar o chá. Um mês depois eu já tava boa. (...). Depois disso tudo o que eu tinha eu ia lá com ele e recomendava pros outros também."
Depoimentos como este podem ser encontrados aos montes na cidade. O falecimento de Sacaca em 1999 foi motivo de luto para toda a população. Todos os moradores o conheciam ou já ouviram falar dele. Seu nome se encontra registrado no "Museu Sacaca" e este acúmulo de experiências não se perdeu. A lista de plantas que curam é enorme e foi usada não só por ele, mas por uma grande quantidade de mulheres de origem cabocla e indígena. Veja algumas:
Alfavaca – Banhos e combate o resfriado.
Alho – Pressão alta, resfriado, gazes.
Amor crescido – Tratamento de fígado e queda de cabelo.
Anador – Qualquer tipo de dor.
Andiroba – Massagens em lesões, combate inflamações e males na garganta.
Arruda – Dor de cabeça e mal olhado.
Babatemão – Estômago e inflamação uterina.
Boldo – Derrame, fígado e estomago.
Cana-ficha – Rins e infecção urinária.
Capim marinho – Calmante e pressão alta.
Catuaba – Reumatismo.
Cheiro da mulata – Derrame e infarto no miocárdio.
Comida-de-jaboti – Pressão alta.
Erva doce – Fígado.
Erva sidreira – Pressão alta e calmante.
Hortelã – Gripe, dor de cabeça e mal estar.
Hortelãzinho – Cólica infantil.
Manjericão – Banhos e combate o resfriado.
Parirí – Anemia.
Pata-de-vaca – Diabetes.
Pião branco – Combate a asma e sicatriza.
Pirarucu – Desinflamatório e vesícula.
Pracaxí – Desinflamatório.
Quebra-pedra – Pedra nos rins.
Sacaca – Anticoncepcional, é diurético e combate a diabetes.
Sucuúba – Inflamação uterina e gastrite.
Trevo roxo – Dor de ouvido.
Existem casos em que a mesma planta é usada para combater doenças de forma variada e algumas tem mais uso medicinal do que consta na lista. Hoje, diversos governos e ONG’s começam a apoiar este levantamento e incentivar a construção de postos de atendimento a população e agentes de saúde qualificados na etnobotânica e etnomedicina. No Amapá, o projeto Farmácia da Terra do IEPA (Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá) nos dá um bom exemplo de interatividade entre o saber popular e o conhecimento científico. São feito trabalhos de levantamento destes dados nas comunidades tradicionais para que os fins em que cada planta é usada sejam comprovados cientificamente. Tudo feito no Centro de Plantas Medicinais do Instituto. Por exemplo, a planta Pata-de-vaca é usada no combate a diabetes por muitas comunidades. O que o IEPA faz é verificar se tal planta contém princípios ativos que realmente combatem a doença. Esse método vem dando certo e hoje são mais de 70 produtos.
O resultado é uma série de fototerápicos em forma de xaropes, pílulas, ungüentos e chás que combatem uma grande diversidade de doenças. Estes remédios são vendidos na farmácia do IEPA a preços simbólicos. Algo em torno de R$ 2,00. Existem também diversos fito cosméticos como o Shampoo de Babosa e o Sabonete de Andiroba. Tudo feito à base de insumos naturais e com pouquíssimas contra-indicações.
Esta é uma prova da eficácia do conhecimento das culturas tradicionais. Figuras como o Sacaca devem ser reconhecidas não apenas como agentes propulsores deste conhecimento, mas também como legítimos e importante colaboradores da saúde, pois os mesmos são uma ótima alternativa aos remédio alopáticos e suas contra-indicações.